Dias de abandono | Resenha ☆☆☆☆
- Mih Moraes

- 30 de mar.
- 4 min de leitura
“Dias de Abandono” é um daqueles livros que te arranca da zona de conforto e te coloca cara a cara com a dor crua da vida. Elena Ferrante, com sua escrita intensa e sem rodeios, mergulha nas profundezas da alma humana, explorando os limites do sofrimento e da reconstrução pessoal. Quando comecei a leitura, sabia que iria encontrar uma história sobre o fim de um casamento, mas o que encontrei foi muito mais do que isso. Ferrante vai além de um simples “rompimento” e nos apresenta a uma jornada visceral e transformadora.
A trama gira em torno de Olga, uma mulher que, após ser deixada pelo marido, vive um colapso emocional e psicológico. O abandono não é só físico, mas também emocional, um abalo profundo em sua identidade e no seu lugar no mundo. O que mais me tocou foi a maneira como a autora descreve o desespero da protagonista. Cada palavra transborda um sentimento de perda e a luta contra o vazio. É um livro que explora as partes mais sombrias de nós mesmos, e de como, muitas vezes, nos perdemos na própria dor.
Mas o que torna “Dias de Abandono” fascinante é que não estamos apenas acompanhando o sofrimento de Olga. A história nos coloca diante de uma reflexão sobre como as mulheres, muitas vezes, carregam o peso do que é imposto a elas pela sociedade – expectativas, papéis, idealizações. O abandono aqui vai além do casamento e se torna uma metáfora para as muitas formas de abandono que as mulheres vivenciam, seja emocional, profissional ou até mesmo existencial.
Eu me vi em Olga em certos momentos, e em outros, senti uma raiva intensa dela. Porque é isso que Ferrante faz com o leitor: nos faz confrontar nossas próprias emoções, nossas próprias falhas, até a nossa empatia. E é isso que é tão poderoso no livro. Não é só uma história de sofrimento, mas uma história de força, mesmo que essa força venha de uma maneira tortuosa e desorganizada.
A escrita de Ferrante é direta, sem qualquer tipo de romantização. A dor de Olga não é diluída em metáforas bonitas ou imagens suaves; é suja, é desordenada, é real. Eu não consegui parar de ler, porque a cada página, uma nova camada da vida de Olga e de sua obsessão com o abandono se desdobrava. O tempo, para ela, se desfaz, e o passado e o presente se misturam em um ciclo frenético de lembranças e delírios.
A personagem é um reflexo de muitas mulheres que, por diversas razões, se veem em situações de vulnerabilidade emocional e social. Ela grita, chora, se perde – mas, ao mesmo tempo, tenta se reinventar, e é nesse processo de reconstrução, mesmo com todas as falhas e tropeços, que a verdadeira força humana aparece.
“Dias de Abandono” não é um livro fácil. Ele não busca conforto, e muito menos a perfeição. Mas é um livro que, com sua escrita crua e sem filtros, nos ensina algo sobre como a dor pode ser o ponto de partida para a transformação. E mais importante: como a partir dessa dor, podemos encontrar um caminho de volta para nós mesmos.
Dicas da Mih
Deixo aqui outros livros com a mesma temática e que podem te encantar também :)
Não tem como não recomendar outro livro de Ferrante, especialmente se você já se conectou com sua escrita. "A Amiga Genial" é o primeiro volume da famosa "Série Napolitana", que segue a amizade complexa e transformadora entre Elena e Lila, duas mulheres com histórias de vida marcadas por amor, traição e superação. A profundidade emocional e a análise da vida feminina são exploradas de maneira envolvente, muito como em "Dias de Abandono".
Neste livro, Didion narra sua experiência pessoal de luto após a morte de seu marido, John Gregory Dunne, e da doença grave de sua filha. A escrita introspectiva e dolorosa de Didion é um mergulho profundo na mente humana e na maneira como o luto altera tudo ao nosso redor, oferecendo uma experiência emocional semelhante à de Olga em Ferrante.
Esse romance, que entrelaça as vidas de três mulheres ao longo de várias gerações, toca temas de isolamento, identidade e o impacto do abandono. A narrativa gira em torno de Virginia Woolf, na época em que escrevia Mrs. Dalloway, e duas outras mulheres que, de alguma forma, refletem o mesmo desespero e busca de significado nas suas vidas.
Embora "A Casa dos Espíritos" seja um romance mais voltado para o realismo mágico, a história de Clara, Esteban, e os membros de sua família é repleta de emoção, dor e lutas internas, tal como em "Dias de Abandono". As questões familiares, as relações de poder e a busca por identidade também são centrais nesse romance. A forma como Allende constrói personagens complexos e nos leva a explorar suas vulnerabilidades emocionais cria uma experiência de leitura com um impacto semelhante ao de Ferrante.










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